Publicado em: 21 de junho de 20204.1 min. de leitura

Sempre tive a sensação de que estivesse fazendo algo errado. Uma culpa, um tormento, um peso na consciência.  Com a idade, veio a clareza: poderia ser resquício da religião. Muita informação religiosa entrou na minha mente, principalmente durante a infância e adolescência. Quer dizer, no final da adolescência, eu já começava a desconfiar de que poderia PODERIA haver algo estranho por ali.

Quando criança, achava que Deus tinha uma televisão, sintonizada em um canal chamado Veronica. Um canal sem graça pra caramba. Quem iria quer assistir uma garotinha tímida e medrosa? Talvez Deus quisesse mesmo, para articular ações de como me amedrontar ainda mais. Deus ocupado comigo? Com todos, pois se dizia na igreja que Ele era onipresente – como o pay-per-view do Big Brotther.

Tensão tenho até hoje. Ela deve ter nascido naquela igreja. Eu sei, ter frequentado começou com boa intenção. Com o tempo enxerguei o pecado existindo ali. Eu achava estranho Deus não ligar para tudo aquilo. Não vai cair uma bomba, um meteoro? Deus não vai chegar do alto de seus cabelos longos e brancos, iluminado por um holofote, como em um show no Rock in Rio ou um especial Roberto Carlos. Ele nunca veio. Ele nunca veio apontar o dedo para ninguém. E nem para mim. Mesmo assim, a tensão existia e existe. Ela sempre esteve em meus ombros. Tento tirá-la quase a força, com exercícios e respiração. É difícil de ir embora. Muito insistente, pois foram anos e anos achando que Ele viria, achando que Ele estava de fato assistindo ao meu canal e anotando todos os meus erros.

Existiram momentos estranhos, onde eu pensava que poderia ter pecado. Será que eu pequei e não me lembro? Será que isso que estou fazendo agora é pecado? Isso do meus altos 14, 15, e até uns 25 anos. Quer dizer, a sensação de parecer fazer algo errado ainda permanece. A diferença está na consciência. Às vezes repito para mim mesma: não há nada de errado em comer bolacha, ou ir ao supermercado na pandemia.  Acreditem: a culpa pode brotar das coisas mais ridículas.

A religião não funciona para mim. Mas eu sei que ela pode funcionar para algumas pessoas. Se me perguntar, eu não indico. Só de passar na frente de uma igreja, minha barriga gela. Nessa hora, dou Graças a Deus de não ter que ir mais. Mas eu ainda tenho curiosidade em relação aos discursos religiosos. Assisto algumas vezes alguns programas na TV, apenas para tentar entender a retórica. Qual é o motivo desses líderes religiosos não terem nenhum peso na consciência ao vender as ideias de milagre? Por muito pouco eu tive peso na consciência. Como ele consegue dormir a noite ao tentar convencer a pessoa a subir no monte e deixar as muletas e bengalas penduraras dentro de uma caverna? Aliás, uma coisa que sempre me pergunto: como alguém com problemas na perna consegue subir todo aquele monte? Enfim. As ideias de milagres são estapafúrdias.

Nunca consegui ler a bíblia. Durante muitos anos senti uma certa nuvem de fracasso pairando sobre minha cabeça por conta disso. Nunca consegui prestar atenção na bíblia. Tenho problemas em me concentrar, dificuldade absurda. É um livro difícil demais, complexo e, me perdoem: chato. Não quero ser ofensiva, é apenas a minha opinião. É como ter preferência por outros estilos literários. A bíblia apenas não me atrai. Eu sei, é pecado dizer isso. Mas eu já percebi que Deus não está muito preocupado. Não, ele não tem um  canal na TV chamada Veronica.

Eu não conseguia entender como as crianças conseguiam decorar os versículos da bíblia e eu não. Aliás, eu não tinha o menor interesse em decorá-los. De uma certa forma, parecia não fazer sentido para mim. Só que eu não sabia racionalizar esses momentos de certa  repulsa. Era muito frustrante ver todos os outros “juniores”, como eram chamadas as crianças não tão crianças assim, apresentar toda a sua decoreba nas aulas. Elas faziam as lições. Eu muitas vezes não fazia. Um professor da escola dominical às vezes me ligava. Ele queria que eu fosse na igreja. Na verdade, sei lá o porquê ele me ligava. Eu nunca entendi aquilo. Era estranho demais. Momentos tensos, eu simplesmente odiava essas aulas.

A verdade é que a religião nunca me trouxe felicidade alguma. Posso sim ter sido feliz em alguns momentos, mas por causa de pessoas. A gente sempre tenta em algum momento ser feliz.

Se quiser ir na igreja, vá, experimente.

Agora, se eu indico? Não.

Compatilhe:

Deixe um comentário

Related posts